Um país doente

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Por Fernando Molica, jornalista, Facebook

Este país está muito doente. Hoje, por volta das 18h, fui constrangido por guardas municipais e xingado por duas ou três pessoas, cidadãos que, antigamente, eram chamados de “populares” pelos jornais.

Aos fatos: depois de acompanhar o ensaio da Beija-Flor na Avenida Atlântica, notei uma movimentação na esquina da Rua Paula Freitas. Um homem com cerca de 70/75 anos, vestido com uma camisa da escola de Nilópolis, reclamava do furto de seu cordão, apontava para dois suspeitos – jovens negros, que teriam, arrisco, em torno de 16/19 anos.




Guardas municipais – uns oito – fizeram seu trabalho, seguraram os dois suspeitos, um deles estava com o cordão, que foi entregue ao homem que havia sido furtado. Até aí, tudo certo. Só que, na Paula Freitas, a caminho do carro da GM, guardas começaram a agredir os dois detidos com golpes de cassetete. Os caras não tentaram fugir, eram magrinhos, estavam dominados. Mesmo assim, apanharam.

Corri então na direção dos guardas e reclamei. Eles estavam certos em prender os dois caras, mas não poderiam agredi-los, cheguei a me identificar como jornalista. Foi o que bastou para um dos guardas – L. Santos, cito de memória – começar a gritar comigo. Disse que a agressão aos detidos fora motivada por desacato: “Eu fui desacatado!”, repetiu. Eu frisei que o fato, condenável, claro, não lhe dava o direito de agredir os dois sujeitos.

Foi quando outros dois GMs – um deles, uma mulher – entraram na discussão, deram razão ao colega. Tentei parabenizá-los pela recuperação do cordão e detenção dos acusados (estava sendo sincero), eles pareceram não me ouvir. O L. Santos, aos gritos, perguntou se eu tinha visto o ocorrido (sim, confirmei), se ficaria feliz se um parente tivesse sido furtado (não, respondi). Perguntou o que eu fizera para resolver o caso (nada, retruquei). Ele ressaltou que estava trabalhando, enquanto que eu estava me divertindo (tentei dizer que este era o trabalho dele, acho que ele não ouvi). O cara me culpou por eu estar me divertindo e, ele, trabalhando.

O guarda falava tão alto (afirmou que eu também usara um tom acima do razoável) que chamou a atenção de outras pessoas (reivindiquei, como cidadão, que ele falasse mais baixo, não adiantou muito). Um homem de uns 30 anos, um dos populares, começou a me xingar, disse que eu era um filho da puta, que deveria levar os bandidos para casa. Comentei com o guarda Santos que o cara estava me desacatando, ele me ignorou.

No fim das contas, fiquei com um certo medo de apanhar dos tais populares (um deles me filmava, como se eu tivesse feito algo errado). Tratei então de ficar perto dos GMs, eles, acreditei, não me agrediriam. Foi quando surgiu um anjo, um ex-colega da ‘Folha de S.Paulo, que, acompanhado de sua mulher, me reconheceu, ficou ao meu lado. Fui com eles até a esquina, agradeci o apoio, fui embora.

Em meio a tantas tragédias, o fato pode parecer desimportante, mas não é assim. O caso demonstra a brutalidade que existe entre nós, o hábito do desrespeito à lei, a força da cultura do linchamento, a lógica dos fins que justificam quaisquer meios. Características que ajudam a explicar a popularidade daquele que, até a semana passada, era o segundo colocado nas pesquisas para presidente da República. Não ficarei surpreso ser ele for eleito.

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