Marcas como Venancio e Universal ocupam lugares antes ocupados por tradicionais cinemas, bares e restaurantes
Por Edu Carvalho, compartilhado de Projeto Colabora
Pode dizer: a cada passo dado hoje pelas ruas da cidade, você se espanta ao achar que não saiu do lugar. O motivo? Dar de cara com a mesma entrada seja das Drogaria Venancio ou das sucursais da Igreja Universal do Reino de Deus. Os dois estabelecimentos se multiplicaram ao quadrado, e há perigo de queda na frente, tal qual os moradores tinham em desequilibrar-se num buraco das pedras portuguesas, que causavam acidentes bem feios por aí.
Com o cenário atual, um fato: o Rio envelheceu, largou a boemia e passou a se encontrar entre os corredores de analgésicos, relaxantes musculares e outras drogas. Tamanho o número de pessoas entre as prateleiras, é possível notar até um trânsito entre as gôndolas, mas não nos espaços em que o funcionamento é 24 horas. Digo, quando consegue-se, também, enxergar que a farmácia funciona durante o período noturno, já que os letreiros são minúsculos, sendo necessário quase de um palmo de visão para apreciação.
Só isso pode explicar as mais de 130 lojas espalhadas por todos os poros da capital fluminense – todas elas geridas por um mesmo dono, vale frisar, como me contou um dos funcionários. ‘’Imagina se fosse franquia?’’, me perguntou um farmacêutico. Preferi fugir da imaginação.
A rede ocupa tudo, qualquer buraco, e disputa hoje com a Universal o título de quem mais apaga as memórias afetivas pertencentes aos lugares mais ‘clássicos’ da cidade, que já ostentou cinemas de rua, bares, delicatessens, restaurantes e prédios – muitos dão, hoje, lugar às duas marcas. Assim foi no início dos anos 2000, quando o templo chegou com os dois pés na porta, expulsando todos os diabos, males e afins de qualquer sobra de rua, para erguer suas colunas e conclamar os fiéis num mesmo endereço.
Nessa briga, permita-me, há algum perdedor? Sim, porque, aliás, é bom deixar claro, os espaços são utilizados, seja para qual fim for. Ou acham mesmo que uma Universal em plena Marquês de São Vicente, por exemplo, estaria ali “só” por estar? Ou por simples birra, frente à Igreja de Nossa Senhora da Conceição, ampliando a rixa católica? Duvido.
Se existe farmácia ou templo, tem gente lá, doa a quem doer, reclame quem reclamar. O problema… o problema é o dia que esses novos lugares forem nosso único ponto de encontro enquanto cariocas. Quando se tornarem motivo de vinda ao Rio, nossos cartões-postais. Esqueça o Cristo, o Pão de Açúcar, o Corcovado e a Pedra da Gávea. Nem ouse passear pelo calçadão do Leblon ou de Copacabana. Será que a Time Out desbancará a Arnaldo Quintela em prol de alguma outra viela que apresente, ao mesmo tempo, Universal e Venancio?
Não sei dizer. Por via das dúvidas, melhor tirar fotos e gravar vídeos enquanto os xodós permanecem vivos, até porque depender de inteligência artificial para recriá-los é entregar a alma pro dia…