O veto dos EUA à equilibrada Resolução do Brasil no Conselho de Segurança das Nações Unidas é algo pedagógico.
Por Marcelo Zero, compartilhado de Viomundo
Marcelo Zero: “Com os EUA sabotando os esforços do Brasil, da ONU, e do Sul Global em prol da paz e da preservação da vida, o cenário só piora. Enquanto isso, as mortes se acumulam e os cadáveres se empilham. A ordem internacional assentada no unilateralismo belicoso, na Otan e numa ONU cada vez mais enfraquecida é claramente inviável. Ela poderá levar o mundo a se tornar uma grande Gaza”. Fotos: Reproduções do vídeo
Ele volta a demonstrar que os EUA nutrem profundo desprezo pelas Nações Unidas e pelo multilateralismo, de um modo geral.
Sua política externa, essencialmente unilateralista, fia-se no seu grande poderio militar e financeiro e em alianças seletivas com alguns países, particularmente os que estão na Otan.
Isso lhes basta.
Os EUA, que não têm interesse objetivo em maior na instabilidade do Oriente Médio, poderiam ter apoiado a Resolução de cunho humanitário apresentada pelo Brasil.
Preferiram, no entanto, negociar sozinhos com Israel e Egito.
“Puxaram o tapete” da ONU e do Brasil. Não é a primeira vez que isso acontece com a diplomacia brasileira. Quando caso o nosso país conseguiu o acordo histórico com o Irã e a Turquia, para resolver o imbróglio em torno do programa nuclear iraniano, os EUA “vetaram”.
Os EUA, se quisessem, poderiam moderar a resposta de Israel ao ataque de Hamas e impedir a continuidade do morticínio da população civil inocente de Gaza.
Não querem. Vão apoiar o objetivo de Israel de “acabar com o Hamas”, o que implicará, é claro, a destruição de Gaza e o possível transbordamento do conflito.
Coisa semelhante ocorre no caso da guerra na Ucrânia.
Os EUA parecem querer apoiar a guerra na Ucrânia, até que a própria Ucrânia seja totalmente destruída.
Logo após o primeiro mês daquele conflito, houve uma clara janela para se chegar a um acordo de paz, assentado na neutralidade do território ucraniano. Mas os EUA impediram e incentivaram a Ucrânia a “resistir”.
Desde então, os EUA já despejaram cerca de US$ 113 bilhões em “ajuda” à Ucrânia. Agora, Biden pede mais US$ 60 bilhões ao Congresso dos EUA.
Insistem na resistência militar da Ucrânia, “custe o que custar” e “pelo tempo que for necessário”, até que a “Rússia seja derrotada”.
Os esforços do Brasil e do Sul Global em prol de negociações sérias e, ao menos, um cessar-fogo sempre esbarram na resistência do EUA, da Otan e do governo Zelensky.
A esse respeito, deve-se enfatizar que a chamada “Fórmula da Paz” de Zelensky é somente uma receita para a continuidade da guerra.
Embora a “fórmula” fale em meio ambiente, segurança alimentar e energética etc., ela não se sustenta.
Todos esses temas, que são do agrado do Sul Global, não passam de cortina de fumaça para ocultar os pontos centrais: Zelensky e os EUA exigem a retirada incondicional das tropas russas, a “devolução” de todos os territórios, inclusive da Crimeia, de maioria russa, o pagamento de vultosas indenizações, o julgamento de autoridades russas por supostos crimes de guerra, a ausência de neutralidade do território ucraniano etc.
Obviamente, não é uma proposta séria de paz. É apenas uma “oferta” fantasiosa e inexequível de rendição incondicional da Rússia.
Zelensky tentará fazer uma reunião internacional, em Malta, para vender sua fórmula de guerra.
Essa reunião de Malta será a terceira organizada pela Ucrânia, com esse objetivo. As duas reuniões anteriores, realizadas este ano na Dinamarca e na Arábia Saudita, contaram com a presença de muitos de conselheiros, mas de poucos Chefes de Estado, principalmente do Sul Global. Como as outras, essa próxima deverá fracassar em convencer o mundo da falaciosa “solução”.
De qualquer modo, o planeta tem, hoje, dois grandes conflitos (além de outros menores) que ameaçam seriamente a segurança internacional.
De fato, tanto o conflito em Gaza quanto o da Ucrânia podem desbordar geograficamente, se intensificar e se aprofundar, com consequências imprevisíveis para todos.
Com os EUA sabotando os esforços do Brasil, da ONU, e do Sul Global em prol da paz e da preservação da vida, o cenário só piora.
Enquanto isso, as mortes se acumulam e os cadáveres se empilham. Até mesmo em caminhões de sorvete.
A ordem internacional assentada no unilateralismo belicoso, na Otan, e numa ONU cada vez mais enfraquecida é claramente inviável.
Ela poderá levar o mundo a se tornar uma grande Gaza.