Uma hipótese para mansidão social

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Por Ulisses Capozzoli, jornalista
Por que Jair Bolsonaro mantém comparativas altas taxas de aprovação (37%) em meio ao caos de seu desgoverno partilhado com um séquito de generais que deveriam estar engraxando canhões (parte do ofício improdutivo e destrutivo deles) em vez de ocupar postos como o Ministério da Saúde?
Uma hipótese é que esse prestígio terá a duração da liberação de recursos indispensáveis a uma sobrevivência miserável por parte significativa da população.
O Brasil nunca se livrou da mentalidade patriarcal, escravista, para ser mais explícito e foi o último país de todo o Ocidente a banir (formalmente) a escravidão com uma carta da princesa Isabel (a Lei Áurea), assinada em 13 de maio de 1888.
O Haiti foi o primeiro a tomar essa iniciativa, em todo o continente Americano, com resistência senhorial que levou a uma revolta reunindo 100 mil escravos. Eles destruíram 180 engenhos de açúcar, além de plantações de café, e mataram 4 mil brancos, fortemente armados para resistir.
A longa prática da escravidão no Brasil está na base da não implantação de uma democracia participativa e se reflete no extermínio da população negra por parte de uma parcela que se enxerga branca, por uma deficiência conhecida por daltonismo, a dificuldade de distinguir cores.
A ausência de uma cidadania elementar, que inclui noção de direitos e obrigações sociais, faz com que uma parcela significativa da população seja incapaz de tecer juízo crítico envolvendo as parcelas financeiras liberadas nesta pandemia pelo governo federal.
Essa população interpreta o dinheiro “dado pelo governo”, na linguagem popular, como um ato de paternalismo, ainda que essa seja a última condição a se esperar de um governo despótico e incompetente, em todos os sentidos positivos eventualmente considerados.
Assim, os que dão apoio (além dos neossenhores) recebem a “ajuda” oficial com sentimento de que deve retribuir com apoio, independentemente do estado das condições econômico-sociais.
Daí a determinação de Bolsonaro em tentar, a todo custo, com repulsivo discurso populista, manter essa fonte de fidelidade que, por si só, deveria merecer uma profunda rejeição de uma sociedade consciente.
O governo conseguirá manter, indefinidamente essa “ajuda”, enquanto a dívida pública aumenta como uma bola de neve por um conjunto de razões que envolvem uma fraqueza profunda da economia?
E que a economia não reage (apesar das baixas taxas de juros oficiais) por falta exatamente de previsibilidade e falta de confiança no (des)governo?
Aqui, mais uma vez, o paradoxo do cachorro que corre atrás do rabo tentando alcançá-lo. Mas tudo tem limites. Mesmo o Universo, se for ilimitado, tem limites no que é possível observar, o chamado “universo observável”.
Além de certo ponto, a expansão do próprio universo faz com que ele exiba o limite da observação e este é um conceito de universo limitado.
O caso do Brasil neste momento tormentoso é de recursos limitados que, na prática, permitem a compra de uma consciência rarefeita por efeito de uma escravidão que nunca foi, de fato, extinta.
O que deverá tirar e mansidão dos submissos é o ronco do estômago, quando o dinheiro acabar.

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