Presidente seguiu decisão do STF, que afasta necessidade de ocupação da terra reivindicada em 1988, mas manteve outros pontos da lei aprovada no Congresso que regulam demarcações
POR RAPHAEL SANZ, compartilhado da Revista Fórum
Na foto: Messias, Lula, Guajajara e Padilha.. Ricardo Stuckert
Após se reunir no Palácio do Alvorada com a ministra Sônia Guajajara, dos Povos Indígenas, o ministro Alexandre Padilha, das Relações Institucionais, e Jorge Messias, o Advogado-Geral da União, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vetou parcialmente nesta sexta-feira (20) o projeto de lei aprovado no Congresso Nacional que, indo na contramão do Supremo Tribunal Federal, instituía o marco temporal para a demarcação de terras indígenas e a indenização a eventuais proprietários de terras lesados no processo.
“Vetei hoje vários artigos do Projeto de Lei 2903/2023, de acordo com a decisão do Supremo sobre o tema. Vamos dialogar e seguir trabalhando para que tenhamos, como temos hoje, segurança jurídica, e também para termos respeito aos direitos dos povos originários”, declarou o presidente Lula no Twitter.
No veto, Lula retirou da lei todas menções à tese do marco temporal, ou seja, os trechos que apontam que apenas terras que tivessem ocupação comprovada em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição, poderiam ser reivindicadas.
O artigo 4 da Seção 2 da lei, que trata de “terras indígenas tradicionalmente ocupadas” é justamente o trecho que trata da tese. “A ausência da comunidade indígena em 5 de outubro de 1988 na área pretendida descaracteriza o seu enquadramento no incise I do caput deste artigo, salvo o caso de renitente esbulho devidamente comprovado”, diz.
Do artigo, apenas dispositivos já previstos na Constituição, como aquele que obriga que os processos demarcatórios sejam públicos e amplamente divulgados, foram mantidos.
“O presidente Lula atendeu aquilo que foi decidido pelo STF, em respeito ao que foi decidido pelo Judiciário. E aquilo que ele pode preservar de contribuição do Congresso Nacional para a demarcação ele preservou”, declarou Jorge Messias, o Advogado-Geral da União, para a imprensa.
Veto parcial
Durante a reunião foi exposta a necessidade de não se fazer um veto total, uma vez que seria mais fácil de ser derrubado pelo Congresso – o que ainda é possível de acontecer. Nesse sentido, a ministra Sônia Guajajara explicou para a imprensa que foi necessário encontrar os pontos do projeto de lei que estivessem dentro da Constituição.
“O Ministério dos Povos inicialmente recomendou o veto total. Posteriormente fizemos uma análise criteriosa e conseguimos, ali, olhar os artigos que já estão garantidos na Constituição Federal, portanto poderiam ficar ali”, disse a ministra para a imprensa.
Entre os artigos que foram mantidos está o 17, que estabelece o regime jurídico e de gozo das terras indígenas tradicionalmente ocupadas para todas os territórios demarcados. Outro artigo mantido foi o 26, que trata do desenvolvimento de atividades econômicas nas terras indígenas. Ele prevê que é permitido contanto que a própria comunidade seja a responsável pela atividade, não podendo estabelecer contratos ou cooperação com terceiros e não indígenas.
O ministro Alexandre Padilha resumiu o veto parcial: “Tudo o que significava ataque aos povos indígenas foi vetado pelo presidente da República. Tudo aquilo que confrontava a Constituição foi vetada”.