Vó Biluca e seus pasteizinhos de nata

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O Bem Blogado passa a publicar textos de Marco Aurélio Vasconcellos, cantor, compositor, poeta e cronista. A pandemia trouxe também coisas boas, como a amizade, que veio no vento minuano pela Internet, deste que outro cronista nosso, o César, também imperador das letras, intitula de Gigante do Sul.

Dono de uma talento que exprime sua alma solidária, Marco Aurélio é amigo constante, mesmo não tendo tido ainda o prazer de abraçá-lo pessoalmente (Washington Araujo)




“Vó Biluca beirava os oitenta e sempre adorou estar com os filhos e netos à sua volta. Jamais escondeu suas preferências e fazia de tudo para atrair a família, fosse através dos costumeiros saraus, fosse pela exibição de seus dotes culinários, em especial nos pastéis de nata, que exerciam enorme fascínio na grande ninhada à sua roda. 

Vez por outra, mandava recados ou telefonava convidando para um chá vespertino, sempre com o grand finale de uma tocata de piano a quatro mãos, ou, simplesmente, avisava: ¾ Hoje tem pasteizinhos de nata.  Estou esperando por vocês…

E assim, com esses artifícios, ela mantinha a descendência ao pé de si. Tanto era o sucesso dos pastéis que, a partir de um determinado momento, as filhas e netas maiores, que já davam os primeiros passos na cozinha, passaram a pedir a receita.

Vó Biluca não hesitava em fornecê-la, fazendo-o de próprio punho com a letra caligráfica. Esquivava-se, apenas, das aulas práticas ao pé do fogão.  A receita escrita é mais do que suficiente, dizia.

O tempo foi passando e nada das iniciadas acertarem os pastéis. O resultado sempre era diferente, fosse no gosto ou na consistência da massa. A estupefação era tamanha que, um dia, filhas e netas resolveram confrontar as receitas recebidas: boa parte era igual, sem tirar nem botar; outras, porém, apresentavam porções ou ingredientes diversos.

Mas nem por isso os saraus e os chás, onde os pasteizinhos centravam a convivência, se amiudaram ou perderam a continuidade. Ao contrário, se intensificaram cada vez mais: Vó Biluca, toda faceirice, encantava-se com a alegria das reuniões e com o sucesso dos pastéis.

Depois que todos iam embora, ela ajeitava a casa, como se nada ali tivesse acontecido. E recolhia-se aos aposentos, onde, na cama turca, adormecia sorrindo.”

Sobre o autor, Wikipedia

https://pt.wikipedia.org/wiki/Marco_Aur%C3%A9lio_Vasconcellos

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