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De norte a sul do país, profissionais de educação alertam para os riscos trazidos por “volta precipitada”
A pandemia trouxe muitos desafios para a educação no Brasil. A falta de equipamentos em casa ou de acesso à internet são problemas enfrentados e discutidos de norte a sul do país. Agora, com o retorno das aulas presenciais em alguns estados, a discussão posta é: a estrutura dos colégios á capaz de fazer uso dos espaços coletivos de forma segura?
O Amazonas é o único estado que já retomou as aulas, desde 10 de agosto. Funcionários da educação do estado denunciam que os protocolos não estão sendo seguidos e servidores são colocados em risco. São Paulo e Rio Grande do Sul são os outros estados que agendaram o retorno para esta terça-feira (8).
Maria Izabel Azevedo Noronha, presidenta da Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), defende que o retorno é precipitado. “As dificuldades do ensino pela internet não podem justificar a volta das aulas no estado sem um programa de proteção seguro.”
“O ensino à distância, como implantado pelo governo do estado de São Paulo, é um mecanismo elitista de distribuição de conhecimento, com agravamento das condições sociais dos alunos das escolas públicas paulistas. A falta de acesso à tecnologia impede que grande parte dos estudantes exerça seu direito à educação. A internet não pode ser a única solução encontrada. Outras alternativas devem existir como, por exemplo, aulas pela TV ou pelo rádio. Há também um problema de qualidade. A escola é insubstituível e a Educação é essencialmente um processo dialógico”, explica.
No Amazonas, o Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado (Sinteam) aponta que os protocolos de segurança não estão sendo cumpridos após o retorno às aulas presenciais, o que tem resultado em contágio pela covid-19 entre os professores. “A secretaria de educação não cumpre o próprio protocolo de segurança” afirma Ana Cristina Rodrigues, presidenta do sindicato.
Segundo Rodrigues, uma vez detectada a doença, a pessoa contaminada é afastada, mas os servidores e alunos que tiveram contato com a pessoa infectada retornam no dia seguinte, após a desinfecção do ambiente. “O correto é que sejam afastados todos aqueles que tenham tido contato com os alunos e com a pessoa contaminada com o coronavírus, e a escola seja fechada por 14 dias”, explica.
São Paulo
A Apeoesp, em conjunto com o Centro do Professorado Paulista (CPP), o Sindicato dos Funcionários e Servidores da Educação do Estado de SP (AFUSE) e a Federação dos Professores do Estado de SP (FEPESP), ingressou com uma ação civil pública contra a volta das aulas presenciais até que haja certeza quanto ao resguardo da saúde de todos os envolvidos: professores, estudantes, funcionários e as famílias, que podem ser afetadas pelo retorno às escolas.
A ação, que questiona também a recente Resolução Seduc 61/2020, solicita liminar para que seja cancelada qualquer programação de volta às aulas durante a pandemia. O pedido requer que todas as escolas públicas (estaduais, municipais e federais) e privadas, no âmbito do estado de São Paulo, sejam mantidas fechadas, permanecendo as atividades de ensino remoto. E, ainda, que não se possa exigir ou estimular, de forma alguma, o comparecimento dos profissionais da educação, nas redes pública e privada, a atividades presenciais nesse período.
Na justificativa, as entidades apontam a irresponsabilidade do Governo do Estado na condução da questão da volta às aulas, em total descompasso com o combate à pandemia em nível mundial. As entidades também anexam e destacam, na justificativa, o estudo realizado em conjunto pela Apeoesp, pelo Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) e pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) evidenciando que: “(…) a infraestrutura das escolas estaduais de São Paulo não permite o estabelecimento dos protocolos de segurança mínima para que se reduza o risco de contágio da covid-19. Com isso, a volta às aulas representa sérios riscos à saúde da população em geral”.
O estudo revelou que em um total de 5.209 unidades escolares, 99% delas não possuem enfermaria, consultório médico ou ambulatório. Além de que 82% das escolas não têm mais do que dois sanitários para uso dos estudantes, ou seja, 93,4% das turmas escolares teriam de ser adequadas para obedecer ao distanciamento mínimo de 1,5 metro entre os alunos, recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
Segundo o levantamento, ao olhar para as edificações escolares se verifica que não possuem garantias de ambientes saudáveis para os alunos e para os servidores que ali trabalham neste momento de pandemia. O mesmo ocorre com as escolas municipais e parte das escolas das redes privadas de ensino.
Para a presidenta da Apeoesp, a secretaria da Educação não pode se omitir da responsabilidade, como tenta fazer na Resolução Seduc 61/2020. “É um absurdo o que a Secretaria da Educação vem fazendo. Ciente do grande perigo, o secretário se omite de qualquer responsabilidade, jogando a decisão de retorno para ‘comitês locais’ formados por professores, funcionários, estudantes e pais, e também para ‘consultas à comunidade’”.
“Além disso, os professores, inclusive do grupo de risco, são chamados a assinar um formulário que isenta o estado em caso de contágio ou morte. Quem tem competência para decidir o momento de retornar às aulas são as autoridades de saúde pública. Hoje, todos os indicativos desaconselham essa volta. As taxas de contágio e mortes continuam altíssimas no Brasil e no Estado”, afirma Bebel.
Em nota, a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo afirmou que “planeja a retomada das aulas pautada em medidas de contenção da epidemia, atendendo aos interesses da população e sem colocar nenhuma vida em risco, seguindo as recomendações sanitárias do Centro de Contingência do Coronavírus.
Ainda de acordo com a nota, para retomar atividades presenciais a partir de 8 de setembro, as escolas devem estar em regiões que permanecem ao menos há 28 dias na fase amarela do Plano São Paulo. As unidades podem receber alunos para aulas de reforço, recuperação e atividades opcionais.O retorno oficial das aulas é previsto para 7 de outubro, o que só ocorrerá se 80% do estado estiver por 28 dias seguidos na fase amarela. A retomada será gradual e, na primeira etapa, vai atingir até 35% dos alunos.
Amazonas
No Amazonas, a presidenta do Sinteam conta que algumas escolas estão proibindo a entrada do sindicato para dialogar com a categoria dos professores. Um dos lugares em que a gestora proibiu a entrada dos sindicalistas foi a Escola Estadual Samuel Benchimol, onde um professor teve o diagnóstico confirmado de covid-19 e foi afastado, mas os demais professores que tiveram contato com ele continuam sendo obrigados a trabalhar.
“Nós não queremos carregar um funeral de uma amigo da categoria, de um estudante, de um ente familiar”, desabafa Beatriz Calheiro, diretora do sindicato.
Em nota, a Secretaria de Estado de Educação e Desporto do Amazonas informou que “todas as 123 unidades de ensino que retornaram foram adaptadas para obedecer aos protocolos bem definidos de distanciamento social, uso obrigatório de máscaras e equipamentos de proteção individual (EPIs), monitoramento da saúde dos alunos, higiene pessoal e dos ambientes escolares e redução de 50% dos estudantes nas aulas presenciais”. As aulas seguem o modelo híbrido, com as turmas dividas em dois grupos, e com aulas intercaladas entre os grupos.
A nota diz ainda que a Secretaria de Educação realiza protocolo de desinfecção das unidades escolares, após a constatação de algum caso positivo para o novo coronavírus. O procedimento é realizado nas unidades quantas vezes for necessário, visando manter a saúde e segurança de todos os envolvidos.