Ana Claudia no Facebook –
Dia desses recebi em casa uma amiga. Pessoa boa, de bens imóveis e de bens intelectuais. Professora aposentada de carreira bem vivida. Budista. Dessas que conhece um tiquinho também de outros mundos, até para a Grécia já foi. Entra em casa. Senta-se no meu sofá e começa a dizer que esses africanos refugiados são muito abusados, ficam andando pela av. Paulista, trajados de africanos. “Se estão no Brasil”, dizia, “que se vistam como brasileiros, oras! onde já se viu mulheres de turbantes nas nossas portas!”
Ao ouvir tamanha asneira, fiquei irritada. Disse que preferiria que ela tivesse deixado o preconceito para fora da minha casa. Ela também se aborreceu e justificou seu pensamento com a ideia de que era descendente de escravagistas e não poderia pensar diferente.
Ei! Mas no Brasil só existem dois tipos de pessoas, o descendente de escravos e o de escravagistas, ainda que sabendo que a miscigenação, aqui, rolou solta, sem o “apartheid sexual” característico de outros países escravocratas. Nada disso justifica o pensamento programado, enraizado, sem cabimento, sem o exercício reflexivo.
Pedi para ela que, da mesma forma, quando tivesse vontade de fazer xixi, assim como de vomitar preconceitos, que não fizesse isso na minha sala. Eu estava brava, e ela, por ser minha amiga, talvez não tenha me compreendido, mas respeitou. Disse até que conheceria os meus amigos refugiados do Congo, professores universitários para quem eu ofereço minha casa em prol das aulas de francês que eles ministram para sustentarem a ONG que ergueram com o objetivo de dar auxílio aos refugiados no Brasil.
Depois, percebendo aos poucos que aquele já não era mais um momento propício para me visitar, minha amiga foi-se despedindo, e se foi. As coisas podem ser sentidas, pensadas, estudadas e também toleradas quando existe uma amizade.