Por Julinho Bittencourt, publicado na Revista Fórum –
A música que faz, o jeito que interpreta e os compositores que lança são o Zeca. É ele mesmo quem afirma: “não existe só o Zeca. O meu sucesso é o de todo mundo”
Zeca Pagodinho completa 60 anos nesta segunda-feira (4) e a festa é de todos. Motivo pra comemorar é o que não falta. Zeca é um dos maiores músicos brasileiros em atividade, um dos grandes ícones do samba e um sujeito e tanto, que quando o problema aparece não foge. O bom malandro que nunca se desligou de suas origens, da sua comunidade e de seus amigos.
Não é, enfim, pra qualquer um encomendar cinco mil letras de cerveja pra própria festa.
A música que faz, o jeito que interpreta e os compositores que lança são o Zeca. É ele mesmo quem afirma: “não existe só o Zeca. O meu sucesso é o de todo mundo”. Tudo o que ele faz vem de onde veio. Lançado pela antológica roda de samba do Cacique de Ramos, Zeca nunca deixou de gravar as composições dos amigos.
E os amigos são gente como Jorge Aragão, Arlindo Cruz, Dudu Nobre, Almir Guineto entre vários outros. Zeca tem aquela coisa inexplicável do grande intérprete. Há algo de mágico nas suas gravações, que começam na escolha do repertório e se estendem ao seu talento nato e explosivo. A divisão rítmica, afinação, o jeito Zeca de cantar que coloca a todos em polvorosa.
Todo esse caldeirão junto faz o sucesso. Quando Zeca canta um samba, ele assume outra dimensão, vira hino e é reverenciado. Nos mais de vinte álbuns que gravou, tudo tem significados em sua vida, signos que ele compartilha com generosidade.
O lindo samba “Quando a Gira Girou”, de Serginho Meriti e Claudinho Guimarães, por exemplo, que Zeca canta como ninguém, parece traduzir a sua ampla e solidária visão de vida e trabalho:
“Quando tudo parece que estar perdido
É nessa hora que você vê
Quem é parceiro, quem é bom amigo
Quem tá contigo quem é de correr
A sua mão me tirou do abismo
O seu axé evitou o meu fim
Me ensinou o que é companheirismo
E também a gostar de quem gosta de mim”
Impossível não lembrar com isso das cenas de Zeca, em janeiro de 2013, indignado, debaixo de chuva desde às seis da manhã, fazendo o que podia e não podia para amparar os moradores de Xerém, logo após uma enchente. O cantor nunca precisou fazer média com ninguém, nunca foi candidato a nada, nunca teve nenhum interesse que não fosse a solidariedade e a indignação.
Assim como sempre compartilhou a sua música com amigos do samba, não se furta a gravar com artistas de outros gêneros. Já cantou com Caetano Velos, circulou o Brasil com um lindo espetáculo ao lado de Maria Bethânia e, em uma de suas gravações mais emocionantes, a linda “Ogum”, de Claudemir e Marquinhos PQD, levou Jorge Ben Jor para o estúdio para declamar a Oração de São Jorge. A mesma que Ben Jor musicou há anos. O resultado é um dos momentos mais emocionantes da música brasileira dos últimos anos.
E é isso que é o Zeca. Carregado de afeto, simplicidade, crença, amizade e solidariedade. Com um talento irrepreensível e repleto de surpresas, ele segue a encantar seu público, que é extremamente variado, indo do povão à elite, sem descriminação.
Longa vida ao Zeca.