Caso Moïse: “Peças são vazadas para tentar incriminar congolês”, diz advogado

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À Revista Fórum, Álvaro Quintão afirma estar “muito preocupado” com condução do inquérito e reforça inocência de Moïse: “Não existe nada que possa afirmar que fosse agressivo”

Por Carolina Fortes, compartilhado da Revista Fórum




Moïse foi espancado até a morte no quiosque Tropicália. (Foto: Reprodução)

Quem é o dono do quiosque Tropicália? A Polícia Militar está envolvida ou não no assassinato? Por que a corporação não fornece cópias do inquérito à família do congolês? Muitas perguntas ainda rondam a morte brutal de Moïse Mugenyi Kabamgabe, espancado após cobrar uma dívida de trabalho no Rio de Janeiro.

Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Assistência Judiciária da OAB-RJ, Álvaro Quintão, advogado da família de Moïse, cobra para que esses e muitos outros pontos sejam esclarecidos. Em entrevista à Revista Fórum, Quintão diz estar “muito preocupado” com a condução da investigação e a tentativa de incriminar e manchar a imagem do congolês.

Segundo ele, enquanto a polícia nega o acesso do advogado e da família ao inquérito, peças selecionadas estão sendo vazadas para a imprensa, com o objetivo de colocar o imigrante como responsável pelas agressões. Em depoimentos à corporação, os responsáveis pela morte do congolês têm dito que ele estava “bêbado”, “agressivo” e até mesmo que teria praticado roubos na região.

“Os autores desse crime bárbaro estão tentando jogar sobre o Moïse uma responsabilidade pelo início de uma situação, como se isso justificasse. Estão tentando construir uma narrativa para que possam se inocentar ou diminuir a gravidade dos atos. Não existe nada desde 2019, quando Moïse começou a trabalhar para esse quiosque, que possa afirmar que fosse uma pessoa agressiva ou qualquer tipo de problema”, afirma Quintão.

Confira a entrevista exclusiva concedida à Revista Fórum:

Como está o andamento do caso do Moïse? O que ainda falta ser explicado?

O inquérito continua, não foi encerrado. Três pessoas foram presas, mas muitas coisas precisam ser esclarecidas. Os autores do crime bárbaro estão tentando jogar sobre o Moïse uma responsabilidade pelo início de uma situação, como se isso justificasse. Tentando construir uma narrativa para que possam se inocentar ou diminuir a gravidade dos atos. Não existe nada, em momento algum, desde 2019, quando Moïse começou a trabalhar para esse quiosque, que possa afirmar que fosse uma pessoa agressiva ou qualquer tipo de problema.

É fundamental entender a participação dos donos dos quiosques Biruta e Tropicália, qual é a responsabilidade desses dois, quem são de fato os donos desses quiosques. Um PM foi apontado como dono do Biruta e a Prefeitura diz que a posse é ilegal, a corregedoria da PM está investigando a participação dele. A comissão de DH está acompanhando, mas infelizmente a polícia não fornece cópias do inquérito. Mas as peças são vazadas e entregues à impressa de maneira a colocar Moïse como culpado do início das agressões. Estamos muito preocupados, mas continuaremos exigindo a total transparência.

A recusa da polícia em compartilhar o inquérito com a defesa é ilegal?

No nosso entendimento, é ilegal, na medida em que estamos atuando oficialmente no inquérito. Uma procuração da família foi recebida pelo delegado, estamos acompanhando o depoimento dos familiares e ainda assim não temos acesso às peças. Uma pergunta que precisa ser esclarecida pela polícia é porque apenas as peças que tentam incriminar ou manchar a imagem do Moïse são vazadas. Nenhum depoimento a favor dele foi vazado.

O senhor acredita que a intenção dos autores, ao incriminar Moïse, é se inocentar?

Inocentar eu acho muito pouco provável, porque as imagens falam por si. No primeiro momento em que um dos agressores derruba ele e os outros dois batem de forma impiedosa, Moïse não teve condições de se defender. O que se está vendo é uma estratégia para tentar diminuir penas e a qualificação dos crimes.

Quais serão os próximos passos?

O inquérito encerrando caberá ao Ministério Público (MP) oferecer a denúncia, enquadrar os agressores nos crimes. Estamos acompanhando e espero que termine o mais rápido possível, para passar para a segunda fase.

Como a família de Moïse está lidando com a situação?

Estivemos ontem com eles quase o dia inteiro, acompanhamos no Ministério Público do Trabalho (MPT), que está verificando a relação de trabalho com o quiosque, para ver se havia ou não uma ilegalidade [na contratação de Moïse] e se outros trabalhadores estão nessa mesma situação. Eles estão muito abalados, perderam um filho, um irmão… É um crime que choca todo mundo. O que estamos buscando é a responsabilização dos culpados e um pouco de paz para essa família.

Durante os depoimentos, um casal falou que avisou a Guarda Municipal que estavam ocorrendo as agressões e eles foram omissos. Caso isso seja provado, eles poderão ser responsabilizados?

Se eles poderiam ter evitado o que aconteceu, podem sim ser responsabilizados por omissão de socorro ou uma série de outras cosias. É importante também no depoimento desse casal a parte que diz respeito aos “conselhos” dos agressores: “Não se metam nisso, queremos dar um corretivo nele”. Prova que estavam bem intencionados em atingir um objetivo, que era de fato matar Moïse.

Há a suspeita de envolvimento da milícia no caso?

Não temos nenhum elemento para provar o envolvimento de milícias. Mas no momento em que começam a aparecer personagens ocultos, um PM que é dono de um quiosque que não está no nome dele [Alauir Mattos de Faria], mas sim de terceiro… As teorias de participação de policiais e milicianos começam a ganhar força, e isso precisa ser esclarecido. Se existem todas essas suspeitas de participação de pessoas ocultas, a polícia precisa entender o porquê.

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