Discussão sobre voto útil entre Ciro e Haddad não fará mais sentido na semana da eleição

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Por Igor Ojeda, publicaado em Le Monde Diplomatique – 

Análise das últimas pesquisas do Datafolha permite concluir que potencial de crescimento do ex-prefeito de São Paulo está longe de estar esgotado, tornando-o favorito a avançar para o segundo turno com alguma folga

A bolha progressista das redes sociais foi tomada nos últimos dias pela discussão sobre a necessidade ou não de fazer voto útil em Ciro Gomes, candidato do PDT à Presidência da República, em detrimento de Fernando Haddad, o concorrente petista ao mesmo cargo.




Segundo quem defende essa opção, por conta do forte antipetismo na sociedade brasileira existente hoje, há um grande risco de uma derrota de Haddad em um eventual segundo turno contra Jair Bolsonaro, do PSL.

Ao se analisar as últimas pesquisas eleitorais do Datafolha, especialmente os dados estratificados e as perguntas suplementares à principal, conclui-se que o desgaste gerado com tal polêmica provavelmente terá sido inócuo.

Se a forte tendência apontada pelas pesquisas se confirmar, a poucos dias da eleição – senão já nos próximos dez dias – Fernando Haddad estará bem à frente de Ciro Gomes, com boas chances, inclusive, de figurar na primeira colocação. Ou seja, a discussão sobre o voto útil ou não em Ciro já não fará mais sentido.

A essa altura, já está evidente que a estratégia de Lula e do PT, de esticar a candidatura do ex-presidente até o máximo, está sendo bem-sucedida. Isso tornou Haddad mais um representante do lulismo do que do petismo. Isso, na prática, significa uma maior musculatura eleitoral. O potencial de transferência de votos de Lula a Haddad, se não absoluta, é bastante considerável. E os números do Datafolha indicam o mesmo.

Os caminhos para esta conclusão estão expostos a seguir. Obviamente, a análise leva em conta um cenário em que as eleições ocorram “normalmente”, sobre o que não há garantia alguma – o discurso ao vivo de Bolsonaro “denunciando” que ocorrerá fraude já no primeiro turno, por exemplo, é uma das ameaças ao processo.

1 – Partindo da óbvia constatação de que Fernando Haddad é o candidato que mais cresceu proporcionalmente nas duas últimas pesquisas Datafolha, não há por que acreditar que seu potencial de crescimento esteja esgotado. Pelo contrário: há ainda muita margem para isso.

2 – No Datafolha de 10 de setembro, 33% dos entrevistados disseram que “com certeza” votariam no candidato indicado por Lula, enquanto 16% responderam “talvez”: um potencial de transferência de 49%. Isso em relação ao total dos entrevistados, não somente aos que votariam em Lula (39% do total na pesquisa de 22 de agosto).

3 – Essa transferência está apenas no começo, e Haddad já empatou com o Ciro em segundo lugar.

4 – A maior parte dos votos ainda não transferidos, mas com alto potencial de transferência, encontra-se justamente nos estratos em que Lula se dava melhor, e que representam uma fatia bastante grande do eleitorado: entre os que têm renda de até dois salários mínimos, os com ensino fundamental, e os eleitores da região Nordeste.

5 – Entre os com renda até dois salários, Lula tinha, em 22 de agosto, 49%; Ciro, 4%Haddad tinha, em 14 de setembro, 16%, depois de 10% em 10 de setembro e 3% em 22 de agosto. Já Ciro estacionou em 13% na última pesquisa, após ligeira alta na anterior. Vê-se que a margem de crescimento de Haddad é considerável.

6 – Entre os que possuem o ensino fundamental, os números são bem semelhantes, seja com Lula, seja com Haddad. Logo, a conclusão é a mesma.

7 – Entre os eleitores do Nordeste, Lula tinha, em 22 de agosto, impressionantes 59% das intenções de voto. Ciro, 5%. Na pesquisa de 10 de setembro, sem Lula, Ciro havia crescido de 14% para 20%, enquanto Haddad de 5% para 11%. Apenas 4 dias depois, Haddad foi para 20% e Ciro oscilou negativamente para 18%.

8 – Ou seja, esse crescimento vertiginoso de Haddad nesses estratos demonstram cabalmente que a transferência é uma realidade concreta, e que deve continuar até 7 de outubro à medida que esses grupos de eleitores forem tomando conhecimento de que o ex-prefeito paulistano é o candidato de Lula.

9 – Pois no Nordeste, por exemplo, Haddad ainda é desconhecido por 40% dos entrevistados. Lá, o potencial de transferência Lula-Haddad é de 64% (49% com certeza, 15% talvez). Já Ciro é desconhecido por apenas 17% dos eleitores do Nordeste.

10 – Segundo o Datafolha de 14 de setembro, o índice de convicção dos que declararam voto em Ciro é de 45%. O de Haddad é de 72%.

11 – Concomitantemente ao crescimento de Haddad, Ciro deve perder votos: aqueles que vinha e vem recebendo de eleitores que desconhecem que o ex-prefeito paulistano é o indicado por Lula e, por isso, declaravam voto em Ciro, ou mesmo os que pensam que o próprio candidato do PDT é o “herdeiro”. No Datafolha de 22 de agosto, Haddad tinha 11% das intenções de voto entre os que declaravam ter o PT como partido de preferência. Na pesquisa de 14 de setembro, esse número subiu para 39%. Já Ciro partiu 14% em agosto, para 18% em 10 de setembro, e de volta a 14% em 14 de setembro, três dias depois de oficializada a candidatura de Haddad. Vale lembrar que estamos falando de um quarto do eleitorado: segundo o Datafolha de 22 de agosto, 24% tinham o PT como partido preferido.

Como dito anteriormente, as pesquisas eleitorais permitem concluir que Haddad muito provavelmente passará ao segundo turno em 7 de outubro, tornando inócua a discussão sobre o voto útil em Ciro Gomes. Soma-se a estes dados a constatação de que o PT possui tempo de TV e rádio, estrutura, base social e forte capilaridade no território nacional, elementos capazes de cumprir a tarefa de tornar o nome do ex-prefeito de São Paulo mais conhecido e associá-lo a Lula. Elementos que fazem muita falta ao PDT de Ciro.

Igor Ojeda é jornalista.

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