Eclipse: quando alguma coisa se manifesta de maneira desconcertante

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Por Ulisses Capozzoli, jornalista, Facebook

Um eclipse total do Sol perturba mesmo um observador experimentado. Você sabe que irá ocorrer e está em campo esperando seus primeiros sinais, mas quando ele se inicia, alguma coisa primitiva se manifesta de maneira desconcertante. O dia, em minutos, se transforma em noite e as estrelas brotam no céu. Animais reagem de forma incomum a uma noite rápida e curta, de minutos.




Observei dois desses eclipses. O primeiro em 11 de julho de 1991, em Manicoré, às margens do Rio Madeira, com a floresta dominando o horizonte. Silenciosa, obscura, misteriosa. O segundo, em 3 de novembro de 1994, em Chapecó, Santa Catarina. Os dois, surpreendentes, apesar de previstos com enorme antecedência.

Hoje (02/07) haverá mais um eclipse solar com sua faixa de totalidade, de menos de 300 km de largura, cortando o Sul do América do Sul. Isso significa que ao longo dessa faixa o eclipse será observado como total, com todo disco aparente do Sol coberto pela Lua. Fora dessa faixa, o eclipse será parcial, tanto ao Sul quanto ao Norte.

No Chile e Argentina o eclipse poderá ser observado como total ou com significativa cobertura do Sol. Em São Paulo o fenômeno começa às 17h00, com o Sol já baixo no horizonte Oeste, uma condição desfavorável à observação. Apenas em pontos mais elevados, eventualmente as posições mais elevadas em edifícios, em que se possa observar a linha do horizonte, será possível observar o Sol parcialmente encoberto pelo Lua (27,3%).

Em princípio, óculos escuros podem permitir a observação direta por duas razões: o sol poente atravessa uma camada mais espessa da atmosfera, e por isso se mostra em vermelho rubro, pela passagem apenas de ondas mais longas e menos energéticas. E também pelo disco aparente do Sol estar parcialmente (27,3%) pela Lua. Observação direta do Sol, no entanto, não é recomendável e, em hipótese alguma, deve-se utilizar binóculo ou telescópio em um eclipse solar, com risco de queima da retina e eventual cegueira. Tradicionalmente utiliza-se, como proteção visual, vidros escurecidos para solda elétrica, em lojas em que esses itens podem ser encontrados por um pequeno preço.

O fato de a Terra e a Lua formarem o que em astronomia é conhecido como sistema binário é que permite os eclipses tanto da Lua quanto do Sol. Planetas com luas minúsculas, como Marte (Phobos e Deimos) não exibem esses fenômenos com o impacto que mostram na Terra. Em Júpiter e Saturno, com suas dezenas de luas, o Sol é apenas a estrela mais brilhante do céu, sem a intensidade observada na Terra (a intensidade da luz, como na gravidade, também varia com o inverso do quadrado da distância).

Além disso, nesses mundos distantes não há observadores mesmo para uma multiplicidade de eclipses. Eclipses solares podem ser totais, anulares ou parciais. Os anulares são eclipses que poderiam ser totais, mas não são pelo afastamento periódico da Lua em torno da Terra, em sua órbita elíptica. Mais afastada, a Lua é incapaz de cobrir todo o disco aparente do Sol. Eclipses parciais ocorrem tanto pela posição de um observador na Terra quanto por um alinhamento apenas parcial do sistema Terra-Lua-Sol.

A previsão de eclipses sempre foi uma fonte de prestígio para a astronomia e, por extensão, para o corpo da ciência como um todo. Foram ainda um meio de prevalência entre homens de culturas diferentes. Ainda que isso não tenha atingido os maias, com calendário mais preciso que o Gregoriano, reformulado pelo matemático Christopher Clavius (1538-1576), entre outros, e promulgado por uma bula papel, a “Inter Gravíssima”, por Gregório XIII, em 1582. Época em que a Igreja esteve acima e além do Estado.

Durante muito tempo os eclipses, em particular os solares, forneceram dados científicos. Foi o que aconteceu em 1919, quando um eclipse visível como total em Sobral, no Ceará, confirmou a Relatividade Geral de Albert Einstein: a curvatura da estrutura do espaço-tempo por uma concentração de massa ou energia, na essência a mesma coisa, em estados diferentes. Como a água líquida, solida ou em forma de gás. Mas sempre água.

Essa época praticamente se esgotou, superada pela era espacial e o uso de telescópios orbitais. Mas, em ciência, nenhuma história está completamente esgotada e, assim, eclipses solares observados em terra ainda podem trazer eventuais contribuições como o completo desvendamento do mecanismo que aquece a coroa solar.

Essa região mais externa do Sol tem temperatura acima de 1 milhão de graus, em aparente contradição com a fotosfera, a camada observável na superfície solar, em torno de uns 5 mil graus. Mecanismos físicos complexos aquecem a coroa que, num eclipse total, emerge como uma luz inteiramente branca e fascinante (luz de diamante) com o disco aparente do Sol inteiramente coberto.

Observar o céu de muitas maneiras é tão fundamental quanto respirar, prover-se de água, alimentos e abrigo. Mas nem por ser fundamental é um conceito assimilado. No século 21, a maioria das pessoas é incapaz de identificar uma única estrela no céu. Não porque sejam limitadas intelectualmente. Mas porque não foram sensibilizadas, na escola e na vida, para a beleza do Universo que nos envolve.

Os próximos eclipses solares visíveis no Brasil vão ocorrer em 26 de fevereiro de 2026 (anular), visível no norte do país; em 6 de fevereiro de 2027 (anular, parcialmente visível no norte). Em 12 de setembro de 2034 (anular) visível no Sul e, em 12 de agosto de 2045, (total) visível no norte. O último, que, lamentavelmente, muitos de nós não estaremos aqui para observar.

Imagem: eclipse total com luz de diamante.

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