Por Artur Araújo

O editorial do InsperNews* (Folha de S. Paulo)  de 08 de setembro, defendendo o retorno imediato às salas de aula, é um grotesco monumento ao cinismo interesseiro.

Quem quiser ler a palangana toda, sirva-se do link (se puder abrí-lo, pois a Folha o restringe a assinantes) . Aqui fico em trechos com comentários.

A moçada do Frias abre com truque de principiante, uma afirmação potente sem nenhuma prova empírica de sua veracidade ou falsidade, porque é cientificamente impossível estabelecer agora o desenvolvimento epidemiológico de uma doença recém surgida.

Isto aqui: “O alongamento da quarentena, entretanto, acarretará prejuízo certo e crescente para crianças e jovens, ao passo que os riscos de infecção se afiguram cada vez mais baixos ou administráveis.

Nesta altura, torna-se claro que a chamada segunda onda da pandemia é evento incomum.” – é puro trololó.

Mas os pontos de maior baixeza surgem depois. “Imperioso se mostra debater e decidir não se aulas devem voltar, sobretudo no ensino público, mas em quais condições.”

Os moços da redação não lêem nem as reportagens do próprio jornal? Aquelas que descrevem há décadas a superlotação de salas, as janelas que não existem ou não abrem, a carência de banheiros, torneiras e bebedouros que marcam a rede pública nas periferias e nas pequenas cidades?

Ou crêem que, com o coronavírus, também veio uma co-epidemia de atenção e eficácia, assolando os gestores do Estado e produzindo magicamente instalações plenamente adaptadas a aglomerações em quadro de pandemia?

“Sem enfrentar o desafio, aumentarão a evasão escolar e a desnutrição de estudantes que dependem de merenda, carecem de meios para acompanhar ensino a distância e são mais vulneráveis à violência doméstica.”

São totalmente alheias às ideologizações dos Insper Boys as alternativas óbvias: distribuição de alimentos para as famílias dos estudantes; fornecimento gratuito de computadores e de acesso a conexão doméstica de banda larga; acompanhento real dos serviços sociais e dos conselhos tutelares.

Não.

Para eles a única coisa a fazer, nesse humanitarismo genocida e de ocasião, é encher o curral com gado prestes a se contaminar e a matar os idosos da família e da vizinhança ao voltar das aulas.

Eles podem sempre se superar, no entanto. Que tal esta? “Mas os governantes devem afastar-se da tentação política, em ano eleitoral, de manter escolas fechadas para não desagradar sindicatos de professores enquanto os shoppings funcionam e as praias estão abarrotadas.”

Jênios.

Já que estamos irresponsavelmente contaminando no comércio e no lazer, por que não fazê-lo nas escolas também? Pode até ser parte do currículo, um experimento de biologia com uso do Método Mengele.

Gato escondido com rabo de fora: “Escolas particulares, ao menos as de elite, já têm pronto um cabedal de medidas de prevenção para reiniciar atividades.”

Todo o arrazoado se resume a apoiar sem vergonha uma demanda dos tubarões do ensino: aval da rede pública para volta às aulas presenciais e à cobrança das mensalidades e taxas.

Se der xabu, se crescerem a contaminação, adoecimento e mortes de alunos, professores, trabalhadores na Educação, familiares, amigos… culpa do Estado que reabriu as escolas.

O fecho do editorial “vírus nos inocentes” é uma ode à hipocrisia: “Ao poder público compete aparelhar-se para tornar isso possível, além de normatizar e fiscalizar as regras de distanciamento mandatórias. Aos educadores e pais, demandar do Estado o cumprimento da exigência constitucional de prover educação –para todos.”

Bacana, né? Ainda mais escrito por quem grunhe, dia sim, dia também, pelo corte alucinado dos gastos estatais.

https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2020/09/volta-as-aulas.shtml

* InsperNews é um bordão que eu uso para ironizar a quantidade de colunistas da FSP que são quadros do Insper – Instituto de ensino e Pesquisa, e para denotar o quanto Luís Frias é um fiel daquele culto ultraliberal com sede na Vila Olímpia, capital paulista.

Charge de André Dahmer