Mais uma tragédia no Rio de Janeiro. Por quê?

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Choveu muito, é verdade. Sofremos os efeitos da crise climática, é fato. Mas as cidades carecem de infraestrutura, gestão, projetos e responsáveis

Por Agostinho Vieira, compartilhado de Projeto Colabora




Na foto: Bombeiros procuram sobreviventes entre os escombros de casas no Morro da Oficina, em Petrópolis (Foto: Carl de Souza / AFP)

Aconteceu novamente. Na terça-feira 15 de fevereiro de 2022 choveu mais em Petrópolis do que a previsão para todo o mês de fevereiro. Em apenas seis horas foram 259 mm de chuva, contra uma média mensal de 240 mm. Aconteceu novamente. A cidade parou, as ruas ficaram alagadas, carros foram arrastados e pessoas morreram. Eram 67 vidas perdidas quando este texto estava sendo escrito. Aconteceu novamente. Entre os mortos, feridos e desabrigados, quase todos viviam no Morro da Oficina, uma das muitas áreas de risco abandonadas pelo poder público. Aconteceu novamente. Diante da tragédia anunciada, os governantes da vez deram respostas evasivas, culparam a natureza e o excesso de chuvas. Aconteceu novamente. Nenhuma autoridade assumiu publicamente que estamos no meio de uma emergência climática, que as nossas cidades não estão preparadas para essa crise e, o mais importante: essa situação tende a piorar.

E não é só no Rio de Janeiro. Nas últimas semanas, ao menos 34 pessoas morreram em função das chuvas fortes que caíram em São Paulo, 18 delas só no município de Franco da Rocha. Em dezembro, 20 morreram e cerca de um milhão ficaram desabrigados no Sul da Bahia. Dias depois, a cena se repetiu em Minas Gerais, com mais de 20 mortos e 340 municípios em estado de emergência. No Sul do país, o calor extremo fez a temperatura ultrapassar a marca dos 42 graus C. Para os climatologistas não há dúvida sobre o que está acontecendo: “É o aquecimento global que torna o clima muito mais variável. Os verões estão ficando mais irregulares e extremos. Existe um aumento dos eventos de chuvas extremas, em que o volume de um mês inteiro cai em apenas um ou dois dias”, explicou José Marengo, diretor do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais, em entrevista para a BBC News Brasil.

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Moradores da região tentam ajudar na busca por sobreviventes. Foto Carl de Souza/AFP
Moradores da Região Serrana do Rio tentam ajudar na busca por sobreviventes (Foto: Carl de Souza / AFP)

Se a crise climática é um fato, se as tragédias devem se repetir e a situação tende a ficar pior, o que falta para que as autoridades municipais, estaduais e federais tomem providências mais efetivas? “Cadê os projetos? Onde estão as metas? Quem são os responsáveis?”. As águas de março, fevereiro ou abril já mataram muita gente por aqui, nas favelas e no asfalto. Há onze anos, em janeiro de 2011, 918 pessoas morreram na Região Serrana, na que foi considerada a maior catástrofe climática da história do país. De lá para cá, fora a instalação de sirenes e a criação de alguns pontos de apoio para moradores de áreas de risco, muito pouco foi feito. A lista de intervenções urgentes, feita pelos próprios prefeitos da região, inclui obras de drenagem de rios, contenção de encostas, programas de reflorestamento, construção de novas moradias para desabrigados e muito mais.

Nos documentos oficiais, muitas dessas áreas atingidas por tragédias são classificadas como de Risco 4, gravíssimo, mas o professor Carlos Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e especialista em mudanças climáticas, dá um outro nome: “áreas de risco suicida”.

“Esse é um problema antigo, complexo e dramático. O Brasil tem cinco milhões de pessoas vivendo em áreas de risco, mas dois milhões estão em locais de Risco 4 ou risco suicida, como eu chamo. Os prefeitos, a quem caberia cuidar mais diretamente do tema, não conseguem resolver. Faltam recursos, faltam moradias para onde eles possam ser levados, falta vontade política”, explica o pesquisador.

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