O gerente Cardoso

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Depois de dois anos, voltei a trabalhar na Agência do Itau Personnalité do Jardim Bonfiglioli (na pandemia, por falta de grana, cheguei até ser despejado).

Por Tom Cardoso, compartilhado de Construir Resistência




Não, não virei o gerente Cardoso.

Continuo jornalista e escritor.

Mas quando chega o verão não há outro refúgio possível para alguém calorento e pobre como eu.

Na agência do Butantã, o único lugar do Brasil onde a classe média é tratada com zelo e carinho, não há só ar condicionado.

Há salas com mesas e tomadas, onde o cliente premium pode trabalhar sem ser incomodado, com direito a três ristretos por dia, servidos pela Mauricélia, copeira e minha amiga.

Quinta-feira tem língua de gato da Kopenhagen.

Na hora do almoço leio os três jornais assinados pela agência: Folha, Estadão e Globo. Já falei para a Mauricélia pedir para a gerência uma assinatura da Piauí.

Não sou cliente e não pretendo ser.

Nesses lugares, ninguém pede comprovante de nada – não é como essas salas VIPs de aeroporto.

Por isso eu fui ficando, mordomia interrompida pela pandemia.

Ontem, às 11h horas em ponto, estava de volta.

Dei um abraço apertado na Mauricélia. Ela parecia triste.

– Que foi, Mau?
– Seu Tom, pegaram a sua sala. Um careca, chato pra caramba. Pede café toda hora e nunca agradece.
– Cê tá falando sério?
– Sim. Mas desconfio que ele também não é cliente. Outro dia ele deixou cair um cartão do Santander.
– Não é cliente? Que cara de pau.
– Por que você não desmascara ele, Seu Tom?

Foi o que eu fiz. Fui até lá e bati na porta.

O cara fez cara de zangado. Me apresentei:

– Bom dia. Sou o gerente Cardoso.
– Bom dia.
– O senhor é cliente da agência?
– Não sou, mas tô querendo ser.
– Para usar essa sala o senhor tem que investir dois milhões em renda fixa. E mais 500 mil no RFGCS Plus Personal Style Banker (inventei essa porra na hora).

Acho que o careca não vem hoje não.

Mauricélia ficou tão feliz que vai adiantar a língua de gato.

Tom Cardoso é jornalista, escritor e crítico musical

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