Acontece, mas não é manchete

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Por Washington Luiz Araújo, para o Brasil 247 – 

“Aconteceu, virou manchete”. O velho slogan da extinta Rede Manchete de Televisão não caberia nos dias de hoje para a maioria dos veículos de comunicação do Brasil. Hoje, o que acontece de realmente importante, para grande parte de jornais, rádio e televisão nem sempre merece a manchete devida. Entretanto, se algo acontecer, o mínimo que seja, ainda que potencialmente, contra o governo federal ou o Partido dos Trabalhadores, então sim, vira manchete grandiloquente, “em letras garrafais”, como se dizia antigamente, quando ainda havia algum respeito pela verdade na imprensa do país.




Então, fica assim:

Bomba no Instituto Lula, não é manchete; malfeitos de dirigentes, parlamentares, governadores e prefeitos tucanos, nunca serão manchetes; a delação mega-sena acumulada premiada de um delator bandido confesso que diz que teria ouvido da vizinha da tia da avó do síndico que um amigo de petista teria pego propina, que ele não sabe quando e onde foi paga, tampouco de quanto foi, aí, claro, vira a manchete que alimenta a sanha indecente: “Petista recebeu propina de empreiteira”.

E assim, de manchete falsa em manchete falsa, vão tocando o barco. Tentam vender hoje o desmentido de amanhã. Às vezes, vendem até como se fosse verdade o que foi desmentido antes de ser publicado. Membros do judiciário cometem afrontas ao estado de direito, mas se for contra o PT e o governo federal, isso passa ao largo e é logo noticiado como se fosse a mais legítima de todas as coisas mais legítimas. Afinal de contas, estão do mesmo lado – do lado que condena, mesmo que sem provas, os “petralhas”.

Há exceções, lógico que há – mas são tão raras que só servem como anteparo às críticas a respeito do quase que total maniqueísmo midiático. Jornalistas de grande caráter, que não querem fazer parte do coro dos inquisidores, vez por outra têm publicado o seu pensamento, o seu trabalho. Mas, na maioria das vezes, a turma do “a manchete nós criamos” prevalece.

Conta-se que o centroavante Serginho Chulapa, grande catimbeiro do nosso futebol, da época em que a expressão catimbeiro era utilizada, assim como também eram utilizadas as manchetes verdadeiras, escolhia o jogo de que queria participar. (Para informação do pessoal mais novo, catimbeiro é o cara que usa de malandragens diversas durante a partida, em proveito próprio e/ou do time). Serginho pegava a tabela de jogos e ia selecionando, como se fosse uma flor na brincadeira de bem-me-quer-mal-me-quer. “Esse jogo vai ser naquela cidade a 600 quilômetros de São Paulo? Não vou. E esse é com o time que tem aquele zagueiro grossão, que dá porrada a torto e a direito? Também não vou. E esse, vai ser apitado por aquele juiz que não gosta de mim? Estou fora!” E, assim, Chulapa arrumava contusão, gripes, enxaquecas e mais um arsenal de “motivos” para não participar da peleja.

Estamos repletos de Chulapas nas redações, que vão escolhendo para onde vai a manchete, da mesma forma que o centroavante do São Paulo e do Santos fazia com os jogos. Mas Serginho era uma minoria e, quando ia a campo, dava conta do recado e, geralmente, alegria para a torcida. Poderia até faltar a um ou outro jogo, mas dava tudo de si quando em campo, e era verdadeiro com a torcida e com os companheiros. No jornalismo praticado por muitos hoje, enganar os leitores, muitas vezes a mando do patrão cartola, é a tônica. E o pior é que muitos desses leitores acreditam, como se Serginho fizesse um gol contra e a torcida aplaudisse, entendendo que foi a favor. Só que o Serginho não fazia gol contra, ao contrário de alguns notáveis representantes da grande imprensa verde-amarela, que, depois, ainda pedem aplauso e troféu. Pedem e, muitas vezes, ganham – para a tristeza de todos os que sabem o que é jogador decisivo (ainda que malandro) e imprensa séria (mesmo que imperfeita).

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